quinta-feira, 12 de junho de 2008

"ELA"...e somente "ela"...

DOMINGO
__________

É domingo ...é? Já não sei ás quantas ando, deitei-me tardissimo, acordei tardissimo, estou cansado. E estou sózinho. Pego nas tralhas e desço para me enfiar no Las Vegas. Antes pela geladaria para ir á maquina do tabaco, no Las Vegas não têm. É a unica coisa que chatei-a no sitio, tem uma pessoa que saír dali quando se lhe acaba a reserva. Como ontem. E depois perguntei ao balcão e "ela" disse-me não sei onde. Onde? Não percebi á primeira, nem á segunda. "Ela" disse um nome qualquer, que era ali á esquerda e então lembrei-me. O que tem um barco na montra? Fui lá mas não era ali, tinha que ir a outra secção. Subi por três degraus numa passagem estreita e do outro lado estava um quiosquezito a um canto do resto da sala. Aí havia, finalmente, cigarros. Lembrei-me de Paris pois não é em todo o lado que se apanha locais de venda. Sta Cruz pode não ter Bancos, nem Posto de Policia, mas tem este toque parisiense...Ou Francês...
Cheguei ao Las Vegas e a mesa onde tinha estado ontem estava ocupada. Ainda me encostei ao balcão, no tempo de espera talvez se despachassem e abalassem. Pura ilusão. Acabaram os cafés mas mantiveram-se sentadas. Bom, não faz mal. Esta mesa, aqui já, também há-de servir.
Pedi uma bica e uma imperial. Nunca antes na vida tinha pedido uma coisa assim. Bica seguida de imperial? E porque não? Precisava do café, a ver se acordava de vez, e sabia que ia ter sede..."Ela" não ouviu o pedido á primeira. Foi tirar a bica e depois ia pagar-se quando lhe lembrei que era também uma imperial. Não fiz atenção ao troco e levei as coisas para a mesa. Já lá tinha pousado o livro antes, e a caneta, para o caso de aparecer alguém com ideias: aquela mesa, aquela cadeira, aquele canto já era meu.
Estava já com o café na mesa e a cerveja também, mas ainda de pé, e "ela" saiu detrás do balcão e passou por mim em direcção á porta. Olhei lá para fora e reparei melhor no que, ao entrar, já tinha visto mas não ligara: havia quatro tipos na rua, na estrada, três deles mascarados de mulheres, que deviam estar com uns grãos a mais nas asas. Metiam-se com a malta que passava. O que não estava mascarado perguntou a uma senhora que leváva um lulu pela trela se podia dizer olá ao cão. Ela disse que sim e ele agarra na coleira, não vá o animal fujir, e aproxima a cara das orelhas do bicho. Dá-lhe um berro tão grande que o cão deve ter ficádo surdo para a semana toda. Os outros três riam-se a bandeiras despregadas . Acho que também me ri mas tive pena do animal.
Os mascarados? Pois, ontem foi Carnaval de Verão. Folia valente, foguetório, carros alegóricos e mais outros tantos restos do Carnaval de Torres Vedras. Mas deve ter sido bem curtido porque aqueles quatro ainda ali estavam.
Um deles o mais alto e de cabeleira mais comprida, pega numa cadeira da esplanda e escarrancha-a á cabeça. Passeia-se assim e está a afastar-se do Las Vegas. É isso que "ela" está a ver da porta, o que diado está ele a fazer com a cadeira. "Ela" volta-se para regressar ao balcão. Quando passa digo "- Aquele engraçou com a cadeira!"
Sorri de leve. leve mesmo. "Ela" quase nunca sorri. É linda, muito, mas sorri pouco.
Sentei-me á mesa e estou a despachar a bica. Preciso mortalmente daquela cafeína. Mortalmente porque sem ela sinto que vou morrer. Já recobro a vida e lá fora a cegada continua. O que se agarrou á cadeira e lhe chamou sua afasta-se com os outros e vai em direcção a outro café do lado de lá da estrada, um pouco mais á frente. Tem uma esplanada minuscula e abancam ali. Ele obviamente serve-se da cadeira que levava. "Ela" sai de novo do balcão e volta á porta. Fica ali um pouco, talvez hesitante, e deve pensar em que alhada se vai meter se for reclamar a cadeira. Eles estão mesmo virados para a folia mas pode-lhes dar para o torto. Ou não?
"Ela" decide-se e num passo decidido atravessa a estrada. A esplanada pequena não é do nivel do passeio, tem que se subir uns degraus. "Ela" não os sobe e fala cá de baixo, olha para cima, não se houve o que se diz. E então ele tem uma atitude amorosa: não deve ter ouvido nada do que "ela" acaba de lhe dizer e inclina-se para "ela", passa-le a mão pela cabeça, pelos cabelos, ternamente perdido de bêbado! "Ela" recua um pouco, talvez meia embaraçada, ou surpreendida mas sempre segura.
De dentro do Las Vegas está toda a gente de olhos postos neles, a ver o que sai dali. Olho para a mesa ao lado e confirmo que está tudo de sorriso nos lábios, a cena é caricata, engraçada, não vai haver azar. Mas não sei se "ela" está nisto confiante, como os sorrisos de dentro do Las Vegas certificam, não somos nós que lá estamos a ouvi-lo, é "ela". Fica-se por lá mais um pouco, talvez ele esteja renitente em devolver o troféu onde se sentou, talvez lhe esteja aexplicar que está apaixonado pela cadeira ou que na verdade precisa tanto da beleza "dela" como de oxigénio. O que quer que seja "ela" regressa á esplanada e ele, quase logo atrás, vem de cadeira na mão e vai para a mesa de onde a tirou. Com muito cuidado, cuidado de gozo, arruma a cadeira e ajeita as outras á volta da mesa. "Ela" não deixa de sorrir. Ele conseguiu que "ela" sorrisse!

Continua...Praia de Santa Cruz, domingo, 6 de Agosto de 1995....Claudio Barros_"To the pretty girl with the pretty eyes" P.

Espectáculo no CAMPO REAL







Espectáculo no CAMPO REAL organizado pelo agencia Moveit...Coreógrafo e agente_ Arcanjo
Estilista_Susana Agostinho
Maquilhador_Kikas
Cabeleireiro_Raquel